28 dezembro 2010

Paradoxos



Se a contradição for o pulmão da história, o paradoxo deverá ser, penso eu, o espelho que a história usa para debochar de nós.
Nem o próprio filho de Deus salvou-se do paradoxo. Ele escolheu, para nascer, um deserto subtropical onde jamais nevou, mas a neve se converteu num símbolo universal do Natal desde que a Europa decidiu europeizar Jesus. E para mais inri, o nascimento de Jesus é, hoje em dia, o negócio que mais dinheiro dá aos mercadores que Jesus tinha expulsado do templo.
Napoleão Bonaparte, o mais francês dos franceses, não era francês. Não era russo Josef Stálin, o mais russo dos russos; e o mais alemão dos alemães, Adolf Hitler, tinha nascido na Áustria. Margherita Sarfatti, a mulher mais amada pelo anti-semita Mussolini, era judia. José Carlos Mariátegui, o mais marxista dos marxistas latino-americanos, acreditava fervorosamente em Deus. O Che Guevara tinha sido declarado completamente incapaz para a vida militar pelo exército argentino.
Das mãos de um escultor chamado Aleijadinho, que era o mais feio dos brasileiros, nasceram as mais altas formosuras do Brasil. Os negros norte-americanos, os mais oprimidos, criaram o jazz, que é a mais livre das músicas. No fundo de um cárcere foi concebido o Dom Quixote, o mais andante dos cavaleiros. E cúmulo dos paradoxos, Dom Quixote nunca disse sua frase mais célebre. Nunca disse Ladram, Sancho, sinal que cavalgamos.
"Acho que você está meio nervosa", diz o histérico. "Te odeio", diz a apaixonada. "Não haverá desvalorização", diz, na véspera da desvalorização, o ministro da Economia. "Os militares respeitam a Constituição", diz, na véspera do golpe de Estado, o ministro da Defesa.

Eduardo Galeano, em O Livro dos Abraços.


Esse é um texto de um dos livros mais encantadores que já li, O Livro dos Abraços. Ele me inspirou pra criar outro cantinho, o Conheço o meu lugar (http://qualquerlugaremeu.blogspot.com/), onde tenho o objetivo de dividir com vocês coisas que leio, ouço, assisto e me encantam. Talvez quem sabe com o tempo até abrir debates sobre os diferentes gostos. Também serve pra vocês me indicarem coisas que os encantam, compartilhar comigo seus gostos.

P.S excluí meu antigo twitter por inúmeros motivos, dois dias depois fiz outro. Estarei por lá, porém menos frequente @larissandrade__


Se eu não voltar por aqui antes, uma ótima virada de ano pra vocês!
:)

11 comentários :

  1. Oun querida.Primeiramente, ótimo texto.
    Acaba que a vida fica como uma peça que pregam.
    Xuxu, tudo muito excelente. Assim que der eu dou uma passadinha no novo cantinho!
    Grande beijo e feliz ano novo pra ti tb!

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  2. =]
    Parece ser legal, vou ler!

    Beijo e feliz ano novo!

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  3. Excelente esse trecho de "O Livro dos Abraços".
    Bjoo!!

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  4. A vida era muito difícil, complicadíssima. Criaram os paradoxos e as incoerências, cá estamos nós.

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  5. Querida menina Sophie!

    Que 2011 encha seu coração de amor por todos os seres que vivem sobre a Terra e te faça esbanjar respeito pela vida, compreensão e solidariedade.

    Seja muito feliz num 2011 maravilhoso!!!


    DEXPEX_{Amar Yasmine}

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  6. Adorei o trecho, Lari, adorei mesmo! Vou até anotar o nome do livro pra procurar depois, fiquei realmente curiosa.
    beijo

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  7. Larissa-flor,

    adorei o texto, mesmo!
    Passarei no novo blog, até porque, seus gostos se parecem muito com os meus.
    Um beijo!

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  8. Sabe, isto só nos ensina, não julgar um livro pela capa, pois as vezes, no seu interior consta mais coisas que imaginamos...

    Fique com Deus, menina Sophie.
    Um abraço.

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  9. Que engraçado, ontem mesmo vi uma entrevista no Canal Brasil chamado "Sangue Latino". Era uma entrevista de meia hora com o Eduardo Galeano onde ele expõe alguns de seus pensamentos e que, provavelmente, escreveu em alguns de seus livros.

    Muito bacana esse texto Larissa!

    Bjos

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